António Cabrita: “Apesar da temperatura licenciosa e própria de um livro erótico”

1-O que representa no contexto da sua obra literária o livro Bicho Carpinteiro?
R-Do que tenho a certeza é que será no contexto da minha obra algo de inesperado e que introduz uma ruptura a vários níveis. O livro que publiquei anteriormente, “Death Can Dance”, era um longo manifesto (oitenta páginas) contra a guerra (tomando como pretexto o conflito russo-ucraniano), um livro de testemunho de uma condição trágica. Este é um livro leve e assumidamente lírico, apesar da temperatura licenciosa e própria de um livro erótico. Por outro lado, a minha poesia sempre foi metafórica (às vezes mesmo considerada hermética) e em “Bicho Carpinteiro” sou muito mais narrativo e divirto-me a contar histórias. Para muitos há-de ter sido um choque o endereço directo destes poemas, que sejam felizes, eu gosto de mudanças e de andar em contramão.

2 – Qual a ideia que esteve na origem do livro?
R-Nenhuma ideia prévia, até que o livro cristalizou no formato que apresenta. Ajudou muito ter-me cruzado com a Bárbara Assis Pacheco e as suas magníficas ilustrações. Por outro lado, como explico no prefácio, sou um sobrevivente da covid (depois de quase um mês de hospital, na corda bamba) e isso deixou-me lesões cognitivas que vagarosamente tenho vindo a sarar. Estes, no essencial, foram os primeiros poemas a salvarem-me da gaguez a que fiquei sujeito e tiveram no corpo e no desejo o seu plinto. Contudo, esclareça-se, este livro é anterior a “Death can Dance”, embora tenha sido editado depois. Na sua edição é que houve uma intenção explícita de introduzir uma mutação não esperada na minha obra – a qual continuará a alternar o leve e lúdico e o pesado, o meditativo; o mais complexo e elaborado e o mais directo e espontâneo, o que já fazia mas a sequência destes dois livros tornou mais transparente. O meu próximo livro de poesia, já escrito e inédito, difere radicalmente de “Bicho Carpinteiro”, mais circunspecto, num retorno ao “espírito do sério”.

3-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R-Tenho dois livros na tipografia, duas obras de ficção que sairão em Outubro, para celebrar o meu regresso a Portugal, depois de vinte anos em Moçambique. É uma narrativa sobre a infância, a adolescência e a ventania do 25 de Abril a desorbitar todos os modelos, com que ganhei o Prémio Baptista Bastos, em 2024, “Se não me quiseres amar agora no inverno, quando?”, e uma reunião de contos sarcásticos e bem humorados em torno desta época de moral claudicante que nos coube viver, com o “reinado” de Trump a escamar o mundo, e que se chama “Make Sequóias Great Again”. E ultimo uma novela que se passará em Moçambique e um livro de ensaios sobre poesia.
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António Cabrita/Bárbara Assis Pacheco (ilustrações)
Bicho Carpinteiro
Guerra & Paz  15€

António Cabrita na Novos Livros | Entrevistas

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