João Pedro Marques: “Dotar os cidadãos portugueses de um conjunto de conhecimentos e de argumentos que lhe permitam, querendo, resistir a essa moldagem”
1-Qual a ideia que esteve na origem do livro Reparações e Outras Penitências Históricas?
R-Excepção feita a quatro textos ainda inéditos, este livro é uma recolha de artigos publicados no jornal Observador. A ideia que esteve na sua origem, tal como na dos três que o antecederam — Combates pela Verdade (2020), Descobrimentos e Outras Ideias Politicamente Incorrectas (2023) e A Culpa do Homem Branco (2024) — foi colocar ao dispor dos leitores interessados os artigos que tenho escrito sobre a escravatura, o colonialismo e outros temas, e que andavam dispersos pela imprensa diária. Sabendo que a questão das reparações, do wokismo, da contestação a certos conteúdos do programa da disciplina de História, nomeadamente os que se relacionam com os Descobrimentos, continuarão a agitar a nossa vida política e a tentar moldar a opinião pública, este livro, tal como os anteriores, visa dotar os cidadãos portugueses de um conjunto de conhecimentos e de argumentos que lhe permitam, querendo, resistir a essa moldagem.
2 – Consegue explicar a origem deste debate e da colocação do tema das reparações na agenda mediática e política?
R-A questão das reparações pela escravatura transatlântica começou a ser agitada pelos estados das Caraíbas e ganhou, posteriormente, projecção internacional durante a Conferência Mundial Contra o Racismo, realizada em Durban, em 2001. De então para cá foi arrastando outras antigas colónias e certos sectores das opiniões públicas nos países ocidentais. Ainda que os estados árabes ou muçulmanos tenham praticado a escravatura em larga escala, a questão não se lhes coloca nem interessa às suas opiniões públicas. Em Portugal o tema começou a aflorar-se na sequência de declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, no Senegal, em Abril de 2017, e adquiriu algum destaque mediático sete anos depois devido também a declarações de Marcelo. Têm sido sobretudo associações de afrodescendentes e sectores da extrema-esquerda que têm tentado propulsionar esta agenda política no nosso país.
3 – A sua posição de princípio é contra as reparações: porquê?
R-Não se trata de uma posição de princípio, mas sim da que resulta de décadas de estudo da história da escravatura e do colonialismo. Há cinco razões de natureza histórica que refiro e explico nas páginas do livro e há uma outra, mais abrangente, que é a seguinte: as coisas pelas quais se pedem hoje em dia reparações eram legais, na altura em que foram praticadas, e foram, aliás, praticadas por todos os povos e nações. Não se pode punir e onerar agora com base em conceitos e normas que então não existiam. Mas se, por hipótese académica decidíssemos que não devia ser a lei a balizar e a sancionar os comportamentos humanos, mas sim a moral, e sendo óbvio que a escravatura e muitas violências do colonialismo foram, sem dúvida, contrárias à boa moral, ainda assim não haveria motivo para reparações por causa da escravatura e do colonialismo, a não ser que estivessemos dispostos a reparar igualmente todas as outras injustiças históricas, incluindo outras modalidades de escravatura sofridas não apenas pelos africanos, mas por outros povos ao longo do tempo. Não o fazer seria evidentemente iníquo e… imoral.
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João Pedro Marques
Reparações e outras Penitências Históricas
Guerra e Paz 17€