David Castaño: Um livro para os que se interessam pelo 25 de Abril e por Mário Soares

1-Qual a ideia que esteve na origem deste seu livro “Mário Soares e o 25 de Abril-O Essencial”?
R-A ideia surgiu há alguns anos. Em 2013 publiquei um livro que em grande parte reproduz a minha tese de doutoramento sobre Mário Soares e a transição para a democracia. Apesar dos cortes e adaptações é um livro extenso, bastante detalhado, com cerca de 600 páginas… Ora, quando se começou a aproximar a data da dupla efeméride, os 50 anos do 25 de Abril e o centenário do nascimento de Mário Soares, que se celebram em 2024, pensei que era a oportunidade ideal para voltar ao tema e tentar escrever um novo livro, mais conciso, destinado ao grande público e que viesse a ser lido por todos aqueles que se interessam, quer pelo 25 de Abril, quer pela figura de Mário Soares.

2-De que forma o livro pode trazer um novo olhar na compreensão do perfil do cidadão e do político Mário Soares?
R-Por estranho que possa parecer, desde 2013 até aos dias de hoje muito pouca coisa foi publicada sobre Mário Soares. Nesse ano o jornalista Joaquim Vieira também publicou uma muito interessante biografia de Soares, mas desde então, pouco se escreveu sobre o líder histórico socialista. Em 2018 foi editado um estudo de uma investigadora da Universidade de Coimbra, Dina Sebastião, sobre Mário Soares e a Europa, que também é resultado de um trabalho académico anterior, mas mesmo depois da morte de Soares, em 2017, parece que os historiadores e outros investigadores não se têm interessado por esta figura que marcou, indubitavelmente, a segunda metade do século XX português. Este livro, que se foca num período muito concreto da vida política de Soares, procura preencher essa lacuna, um pouco incompreensível. Não se trata, por isso, de um novo olhar, mas de um olhar mais focado. O que pretendia Soares nos últimos anos do Estado Novo? Qual o caminho que preconizava para o país? Que fazer com a guerra colonial? Qual o relacionamento com Marcelo Caetano? Estas perguntas são respondidas no primeiro capítulo do livro. O segundo, focado na ação de Mário Soares enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros dos primeiros governos provisórios, trata essencialmente do seu papel no processo de descolonização, das tensões com o general Spínola e do progressivo afastamento de Soares da condução desse processo, à medida que o MFA começava a assumir as rédeas do poder político-militar. O terceiro é essencialmente sobre o PREC, sobre as dificuldades em implementar uma democracia pluralista, representativa, de tipo ocidental e sobre o papel determinante que Soares desempenhou na afirmação dos partidos políticos, na luta pela realização das eleições para Assembleia Constituinte, ou para assegurar que os resultados eleitorais não fossem desrespeitados. Finalmente, o último capítulo aborda um aspeto central na ação política de Soares: os contactos internacionais, que começaram a ser estabelecidos ainda durante o regime anterior, e que vieram a revelar-se determinantes, não apenas para a implantação do PS a nível nacional, mas também na vitória das forças moderadas contra aqueles que desejavam implantar em Portugal modelos alternativos à democracia liberal.

3-Mário Soares foi um dos fundadores do regime saído do 25 de Abril e o seu papel essencial em muitos momentos: como historiador, nos 50 anos da revolução do 25 de Abril, que balanço faz desta personalidade?
R-Soares é o líder civil da transição democrática. Como sabemos foram os militares que derrubaram o anterior regime autoritário. No entanto, no seguimento do golpe militar, assistiu-se ao início de um processo revolucionário cujo desfecho se tornou imprevisível. Várias figuras e líderes partidários também pretenderam evitar que a deriva radical colocasse em causa a implantação de um regime democrático, mas por um motivo ou outro foram sendo afastados do processo, perderam poder e influência e deixaram de ter qualquer capacidade para contrariar o rumo dos acontecimentos. Soares teve essa capacidade. Mesmo quando foi afastado da liderança do ministério dos Negócios Estrangeiros ou quando deixou os governos provisórios, conseguiu evitar ser posto completamente fora do processo. Em vários momentos ele teve a noção clara que era necessário fazer cedências, contemporizar, a fim de evitar que os acontecimentos tomassem uma direção que, para ser revertida, exigiria custos muito maiores. Mas, ao mesmo tempo, quando achava que era necessário afrontar os poderes estabelecidos, criticar, ou provocar ruturas, também o fazia. Essa gestão era muito difícil, mas Soares soube fazê-la. Sem ele, o caminho para a democracia teria sido ainda mais tortuoso e, muito provavelmente, menos pacífico.
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David Castaño
Mário Soares e o 25 de Abril-O Essencial 
Edições 70   17,90€

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