“Todas as revoluções têm as suas tensões e que podem derrapar para situações próximas da democracia directa”

1-Qual a ideia que esteve na origem deste novo livro, «Expropriados de Abril»?
R-A ideia de lançar este novo livro surgiu principalmente por duas razões: novas obras, análises e documentos que surgiram sobre este tema nos últimos 20 anos e o contexto histórico de se assinalar os 50 anos quer do 25 de Abril, quer do 25 de Novembro. Estavam reunidas as condições para voltarmos a enquadrar o material que já tínhamos recolhido com as novas abordagens que, entretanto, tinham sido divulgadas. Assim, foi possível construir um livro que vai mais longe no enquadramento económico e social daquele período e analisa factos ainda pouco conhecidos publicamente como, por exemplo, o que se passou nas multinacionais que nessa altura estavam em Portugal.
2-Agora que já passaram 50 anos sobre o PREC, a vossa investigação permite apresentar um balanço sereno daqueles meses “loucos” no âmbito do mundo empresarial?
R-A nossa investigação permite apresentar um balanço factual daqueles tempos. Fala de experiências pessoais e coletivas, da euforia de uns e da desilusão de outros, da forma como, em alguns casos, o poder nas empresas passou rapidamente de mãos e se meteu num beco sem saída, do romantismo trágico da revolução e do choque da realidade sobre como a economia funcionava. Cinco décadas depois, é possível perceber que o que passou naquele ano e meio, entre Abril de 1974 e Novembro de 1975, teve consequências económicas e sociais relevantes, que ainda hoje se fazem sentir na sociedade portuguesa.
3-Como em todos os processos revolucionários, terá havido exageros de parte a parte e uma dúvida subsiste: naquele contexto, tudo poderia ter sido feito de outra forma?
R-Os historiadores, os economistas ou os ficcionistas serão as pessoas indicadas para fazer essa análise contrafactual. Do nosso ponto de vista, todas as revoluções têm as suas tensões e que podem derrapar para situações próximas da democracia directa, com consequências imprevisíveis. Estes movimentos sociais não surgiram de geração espontânea, e, como referimos no livro, grande parte das ideias que moveram as massas após o 25 de Abril já suportavam o movimento estudantil e sindical, as organizações e as elites de oposição durante o marcelismo. Depois radicalização vivida em Portugal, sobretudo após o 11 de Março, caucionou os exageros que se cometeram um pouco por todo o lado e a euforia revolucionária que se viveu nessa época. Os resultados das eleições de 25 de Abril de 1975 mostraram uma outra realidade, que não “colava” com essa radicalização, mas o processo revolucionário já estava em curso e só o 25 de Novembro o travou. Com ou sem excessos há um dado incontornável: o equilíbrio de poderes nas empresas teria de mudar e isso causaria sempre tensões entre empresários, lideranças políticas e trabalhadores. Sem o contexto revolucionário da época é provável que essa mudança tivesse decorrido de uma forma mais pacífica e sem necessidade de instigar ocupações ou decidir nacionalizações, algumas delas pouco sensatas do ponto de vista económico e social.
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Filipe S. Fernandes/Hermínio Santos
Expropriados de Abril
Clube do Autor 19,50€

