Yves Léonard: Compreender e explicar uma paixão de natureza sentimental

Yves Léonard estuda a história de Portugal há muitos anos. Dele já conhecíamos a História do Portugal Contemporâneo. Agora, surge uma obra mais abrangente em que o historiador percorre as etapas mais importantes da nossa história. A visão de um estrangeiro que tem por Portugal “uma paixão de natureza sentimental”.
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P-Como surgiu o seu interesse por Portugal e pela sua história?
R-É uma longa história que remonta aos meus 20 anos, quando descobri Portugal, sem ter laços com Portugal até então. Uma descoberta e uma paixão de natureza sentimental. Desde então, Portugal esteve sempre presente, ao ponto de se tornar um objeto dos meus estudos de história, até ao doutoramento e à minha habilitação na Sorbonne. Isto é mais de 30 anos de pesquisa e publicações

P-Este seu novo livro percorre toda a nossa história. Razões desta opção: foi para melhor compreender e enquadrar o Portugal contemporâneo?
R-Por um lado, sim, porque é impossível compreender a história contemporânea de Portugal sem olhar para o seu passado mais distante. Por outro lado, para melhor compreender a relativa modernidade do Estado-nação em Portugal, construído e consolidado no século XIX, embora o Estado monárquico em primeiro lugar seja mais antigo – e mesmo um dos mais antigos da Europa com uma unidade e fronteiras continentais estáveis desde o século XIII. Mas a nação moderna aparece mais tarde no prolongamento do Iluminismo e das revoluções do fim do século XVIII.

P-Sente que, como estrangeiro, consegue trazer para a sua escrita da história de Portugal uma visão mais neutra e distanciada?
R-Em algumas coisas eu acho que sim, digamos, com uma distância. Mas tendo sempre em mente e como salvaguarda o rigor do método histórico e esta vontade de compreender e explicar, e não de julgar.

P-Do seu ponto de vista, quais são os personagens mais marcantes da história de Portugal?
R-É sempre difícil responder a esse tipo de pergunta, com o risco de reduzir a história a algumas datas ou personagens famosos. Em suma, uma galeria de retratos misturando figuras políticas : reis e rainhas desde Afonso Henriques, D. João e D João II, até D. Luís e D. Carlos, passando pelo infante D. Henrique, Dona Filipa de Lancastre, assim como o marquês de Pombal, Salazar, Mário Soares e alguns outros, a escritores ou artistas – com Camões, Almeida Garrett, Eça de Queiroz, Pessoa, Saramago –, sem esquecer figuras míticas, lendárias, como os grandes navegadores , D. Sebastião, Inês de Castro. Ou mais perto de nós os capitães de Abril com a figura icónica de Salgueiro Maia. Mas tambem grandes atletas como Eusebio, Agostinho ou Cristiano. Mas isso é necessariamente redutor.

P-Em Abril de 2024, assinalamos os 50 anos da revolução dos cravos: como interpreta essa data no contexto do Portugal contemporâneo?
R-Como um acontecimento essencial, fundador da democracia. O dia 25 de Abril é uma data chave do século XX, não só em Portugal, mas no mundo. E como uma mensagem de esperança e vitalidade que deve ser meditada e continuamente vivificada.

P-Estudar o passado para compreender o presente e pensar o futuro: que Portugal estamos hoje a construir para o futuro?
R-Digamos um futuro cheio de promessas e de esperanças, por exemplo as de Abril de há 50 anos. Se alargarmos ao espaço-mundo no qual se encontra inserido Portugal, devemos manter aberto o horizonte, esta « parte da superfície terrestre onde termina a nossa visão », como definia Emile Littré no século XIX. E se a história nos ensina a complexidade e a incerteza, ensina-nos a saber dar um passo atrás, mas também a comprometer-nos para que o amanhã permaneça habitável. Em suma, como já escrevia Victor Hugo em Les Misérables, a « tomar corpo a corpo o destino, a surpreender a catástrofe. »
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Yves Léonard
História da Nação Portuguesa
Planeta  20,50€

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