João Maurício Brás: “Uma nova barbárie mas também um vírus, o pior dos vírus, o da ignorância, do ressentimento e imbecilidade”

1-Qual a ideia que esteve na base do seu livro “Textos sem Açaime”?
R-O mundo em que vivemos não presta, é necessário expô-lo, submete-lo à sátira e demonstrar que é possível voltar a ser livre e decente. O livro tem duas partes distintas, uma primeira que fornece indicações sobre o como viver num mundo que se assemelha cada vez mais a uma prisão de alta segurança tecnológica (vivemos fechados no on-line) regido pelo consumismo, pelo espectáculo, pelo hedonismo e por um egoísmo patológico.Um texto de Solzhenitsyn, Live Not by Lies, serve-me como referência. Actualmente já não podemos dizer o que pensamos, nem há verdadeira liberdade de pensamento e opinião, pois facilmente seremos silenciados e diabolizados, apodados de extremistas de direita, fascistas, populistas, etc.. mesmo que não tenhamos nada a ver com esses adjectivos.  È preciso saber resistir, ter boas respostas e boas opções. Em certo sentido encontramo-nos perante a ideologia dominante, hiperliberal progressista (deformação do progresso) como os russos se sentiam perante o regime comunista. Na segunda parte do livro sigo um princípio fundamental, para percebermos se uma ideia é boa ou grotesca e absurda, devemos submetê-la ao máximo de ironia, se ela resistir é boa, se não resistir, não presta. Submeto então as teses insanas do presente sobre o género, sexo, raça, ambiente, clima, veganismo, animalismo, etc…para tentar perceber se resistem. A maior parte não resiste. Este é portanto um livro irónico, mas com uma ironia cáustica e dura. Não tenho paciência para os activismo do género, os racismos anti-racistas que querem que nos odiemos e ao nosso passado, nem para a ideologia do bem dogmático e para os esquerdistas que só vivem bem num sistema capitalista, nem para as tretas lgbt, ao mesmo tempo que um mundo apodrece e se transforma num supermercado, dominado por grandes corporações que têm apenas a exponenciação do lucro como único e principal objectivo…Esses activismos são os piores inimigos do que dizem defender, são seitas, que vivem da divisão e do extremismo, e não do que une.

2-Como analisa o movimento woke que tem ocupado parte substancial do espaço mediático e promovido a cultura do cancelamento?
R-O movimento woke é uma espécie de religião laica, um novo estalinismo que assenta em simulacro de sentido e falsos valores. Só encontramos ideias grotescas como a ideia que não há homens nem mulheres, que  tudo é uma construção cultural, que o homem branco é colonialista e esclavagista, a heterossexualidade é uma tara heternormativa, somos todos trans, que pensar e ser critico é ser facista, etcetc…É uma nova barbárie mas também um vírus, o pior dos vírus, o da ignorância, do ressentimento e imbecilidade. O que conta no mundo actual é a economia, os valores fundamentais foram transformados em farsas burlescas, este é tempo de uma antropologia do desenraizamento, do ultimo homem de que falava Nietzsche. Greg Lukianoff e Jonathan Haidt publicaram em 2019 A Transformação da Mente Moderna que tem o seguinte subtítulo: Como as boas intenções e as más ideias estão a condenar uma geração ao fracasso, Gad Saad publicou em 2022, A Mente Parasitária, sobre o wokismo e o progressismo ( doença infantil do novo liberal esquerdismo), explicando-nos como ideias infecciosas anti-ciência e anti-razão, anti-história e anti-factos estão a matar o sentido comum e criaram uma epidemia de imbecilidade e deliriosos perigos instituídos como leis e normas jurídicas, sociais, escolares… Douglas Murray fala-nos da “loucura dos loucos” e em como assistimos no Ocidente ao triunfo da desrazão, da irracionalidade, do emotivismo. Estes livros e autores são boas balizas para estudarmos o wookismo, que também existe na direita. Saad, por exemplo, refere-se à atmosfera mental do wokismo que já é política oficial e está entranhado no sistema jurídico e educativo e faz parte da propaganda massiva dos média. Trata-se, portanto, de uma pandemia mental terrivelmente devastadora que destrói a capacidade das pessoas pensarem racionalmente e que conduz a uma perda total do sentido da realidade e do reconhecimento das verdades mais evidentes. Esse foi o trabalho das universidades americanas, validado pelos políticos ocidentais e vendido pelos média e potenciado pelo modelo económico liberal. O capitalismo tem uma vertente woke, o consumo deve ser associado ao que se presume ter um boa consciência e estar do lado certo… Qualquer pessoa afectada por esse vírus perde a capacidade de usar a razão e a lógica, de reconhecer factos e evidências básicas, e até de distinguir a verdade da ficção e da mentira, afastando-se da realidade, do sentido comum e da verdade. Esses parasitas impedem também o pensamento crítico e racional. Os principais exemplos desse parasitismo são o feminismo radical, o construtivismo social, a teoria crítica da justiça e o pós-modernismo. Veja-se como o politicamente correcto, a cultura do cancelamento, a nova polícia do pensamento e da linguagem, o relativismo moral e cultural, a tara construtivista e perspectivista, o egoísmo atomizado sórdido, a ideologia vitimista, a cultura da queixa, as políticas identitárias, o multiculturalismo como filosofia política se normalizaram e nos ensinam o ódio a nós mesmos. A luta contra este tipo de terrorismo intelectual liberal progressista e esquerdista é cada vez mais uma guerra pela defesa da nossa sanidade mental. Este livro, Textos sem Açaime, é um manual de guerrilha indispensável sobre estes temas. É necessário rir, não respeitar as visões manicomiais que nos querem impor como dogmas.

3-Parecemos estar imersos num mundo em crise, em guerra e em que a democracia está em risco em muitos lugares. O que poderá ser feito para construir uma alternativa?
R-Sim, essa questão é crucial,  mas não do modo como nos dizem que devemos ver o problema, é que vivemos sob um grande embuste, os grandes inimigos da democracia, aqueles que estão a destruir democracia, são aqueles que se apresentam como os seus donos e guardiões. Hoje no Ocidente predomina um poder transnacional, dos mercados, dos bancos, quem manda é uma super-poderosa elite económico-financeira, ora a democracia só se concretiza numa escala local, regional e nacional. Não há democracias televisivas e de propaganda permanente. Há uma afastamento total entre essas elites liberais e progressistas e as pessoas, o homem comum que já não tem qualquer influência sobre o nosso destino, apenas deve consumir e reagir à sineta com o cão de Pavlov.  Estas elites liberais e esquerdistas libertárias afastaram-se totalmente do que são as práticas democráticas, e no caso da esquerda, até das questões da justa redistribuição da riqueza, da valorização do trabalho e das classes trabalhadores, e da cola das comunidades, dos seus valores fundamentais e das instâncias que oferecem resistência ao poder directo do tirano, do Estado ou do patrão sobre o individuo. Por isso está a surgir uma nova direita que vai ao encontra das necessidade e da voz do homem comum. Se é apenas oportunista ou se representa uma possibilidade para o futuro da democracia, só o tempo o dirá. O facto do sistema estar em pânico é um bom sinal, é porque as suas estruturas totalitárias estão a ser abaladas, daí a diabolização dessa direita como fascista e populista, porque está em causa o seu poder que se quer totalitário. A esquerda do presente, falhou, traiu as pessoas, trata-se também de uma elite afastada dos homens comuns e que nada tem a ver com a esquerda da sociedade decente. Esta esquerda pós-moderna é anti-futuro e anti-pessoa, é apenas uma espécie de idiota útil de um sistema que transforma em mercadoria todas as dimensões da nossa vida, e que destruiu qualquer noção de valor, porque tudo agora tem um preço. A alternativa passa por recuperarmos a dimensão ética das nossas vidas, colocar a economia e a tecnologia ao serviço do homem, e não o homem ao seu serviço, recuperar o poder para as dimensões locais e nacionais, revalorizar as instituições que nos davam um chão e formas de solidariedade e convivialidade. Perdemos a noção de bem comum, somos apenas seres atomizados em competição uns com os outros. É preciso regressar ao essencial, aos grandes valores civilizacional, à verdadeira vida em comunidade, à cultura, aos grandes livros e grandes autores, aos valores fundamentais, à espiritualidade e à religião. A guerra é própria de homens doentes e a vida que temos hoje em dia é uma doença.
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João Maurício Brás
Textos sem Açaime
Opera Omnia  15,90€

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