Virginia Woolf, dia a dia

CRÓNICA
| agostinho sousa

Um diário onde ressaltam as angústias permanentes quanto à sua qualidade como escritora, bem como as relações literárias, de amizade e camaradagem de um grupo – que será conhecido como o Grupo de Bloomsbury -, entremeadas com as viagens pelo Reino Unido e outros países da Europa, com as frequentes dúvidas existenciais sobre a qualidade daquilo que escreve e que a levarão ao suicídio (após uma primeira tentativa falhada).
Pelo meio há descrições do dia-a-dia, mais ou menos banais da vida comum, misturadas com grandes discussões e pensamentos literários.
O período mais rico é aquele que antecede e relata a Segunda Guerra Mundial, onde afirma, prematuramente, o horror daquilo que viria a ser posteriormente conhecido, ainda que numa ínfima escala e por aproximação, como as atrocidades que os nazis preparavam (em relação aos judeus e aos povos dos países vizinhos, gradualmente invadidos).
Em paralelo, este Diário serve-lhe como reflexão à elaboração dos seus livros como quando menciona: «escrevo para que assente a poeira do meu cérebro.»; ou: «E, no entanto, a única vida que me entusiasma é a vida imaginária.» Bem como, dada a sua extrema exigência e rigor, para matutar sobre as desilusões que a atormentam: «Raras vezes senti uma infelicidade tão extrema como ontem por volta das seis e meia da tarde, ao reler a última parte de Os Anos. Quanto palavreado oco – que lengalenga morna aquilo que pareceu; revelando a minha decrepitude em todas as tão numerosas páginas.»
Mas também tem passagens de contentamento, como quando menciona a visita à casa-castelo onde viveu Montaigne e se maravilha com a paisagem que vê através de uma janela, imaginando que esse escritor teria interrompido a sua escrita para olhar na mesma direção.
O livro é complementado com um exaustivo conjunto de notas, que ajudam a localizar, no tempo e no espaço, situações mais particulares. Há também uma síntese que retrata cada um dos principais participantes do Grupo de Bloomsbury.
Curiosamente, a 6 de janeiro de 1940, coloca esta pergunta: «Por qual dos nossos amigos se interessará mais a posteridade?». E vai descrevendo cada um deles, entre explicações e pensamentos, posicionando-os nesse imaginário ranking do futuro que ela cria, esquecendo-se daquela que ainda hoje mais se destacou.
Ironicamente o seu presságio, escrito a 4 de janeiro de 1929: «hei-de desaparecer, como passa uma nuvem sobre as ondas», não se concretizou e a sua escrita perdura elevando-a à figura de proa desse afamado Grupo.
Espinho, 08/12/2023
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Virginia Wolf
Diários 1927-1941
Bertrand Editora

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