
[Fotografia: Veríssimo Dias] Diana Andringa, jornalista com uma longa carreira, reuniu agora em livro o trabalho realizado no âmbito de uma série documental exibida na RTP em 1992. Uma muito valioso conjunto de entrevistas que nos permite conhecer bem a década de 60 do século XX. Uma visão plural em que se compreende a essência do nosso país no tempo da ditadura e se pressente o futuro que a democracia permitiu.
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P-Qual a ideia que esteve na origem deste seu novo livro “Geração de 60”?
R-O livro parte de uma série documental que fiz na RTP, foi exibida em 1992 e para a qual pude recolher um grande conjunto de entrevistas em Angola, Cabo Verde, Guiné e Portugal, que, guardadas no Arquivo da RTP, têm sido úteis a camaradas de trabalho e a investigadores que trabalham sobre esses anos. Ainda recentemente a entrevista feita a Mário Pinto de Andrade foi utilizada pelo realizador norte-americano Billy Woodberry para o seu filme “Mário”. Entendi que valia a pena aproveitar essas entrevistas e usá-las num livro em que podiam ser mais aprofundadas e se tornariam também mais acessíveis às pessoas interessadas.
P-O livro é, como escreve, um “álbum de memórias”. Nele reuniu as palavras de um conjunto muito vasto e plural de mais de cem entrevistados: que Portugal é este que se descobre com a leitura do livro?
R-O Portugal do Estado Novo, a opressão, o colonialismo, e a luta dos povos de Portugal e das antigas colónias contra o fascismo e o colonialismo. A realidade que a Censura nos impedia de conhecer.
P-Esta é, de certa forma, uma muito rica história oral (e documental) de uma década essencial do século XX português: para si, como jornalista, seria interessante fazer um outro volume sobre a década de 1970 em que muito do que aqui se pressente realmente aconteceu?
R-Escolhi a década de 60 porque foi extremamente importante na criação das condições que levaram ao derrube da ditadura e à independência das colónias na década seguinte, mas também porque penso que esclarece como se forma a consciência política de gerações que o poder pretende manter na ignorância. Quanto à década de 70, além de pessoalmente ter passado os primeiros 20 meses presa no Forte de Caxias, já foi mais investigada e tem, certamente, quem a trabalhe melhor do que saberia fazê-lo.
P-Nos anos 1960, a Diana era muito jovem [nasceu em 1947]: que memória pessoal guarda dessa década?
R-Foi nela que aprendi o que era na verdade o país em que vivia, como nos era ocultada a informação e a capacidade de revolta contra a opressão. A frase pode parecer pomposa, mas foi nela que me tornei a pessoa que sou, que me fez ser jornalista, que me fez continuar sempre a lutar por um mundo melhor, que me fez perceber a importância das palavras Liberdade, Igualdade e Fraternidade que tão vagamente abordáramos na escola.
P-Começou a trabalhar neste projecto em 1988 mas, só em 1992 conseguiu que uma segunda versão do seu trabalho televisivo fosse exibido na RTP-2: esta memória era incómoda?
R-Parece que falava demasiado de coisas desagradáveis, guerra colonial, polícia política, prisões, tortura, racismo, descriminação – numa década que também tinha tido os Beatles e a Mary Quant.
P-Passaram mais de 30 anos sobre o momento inicial e mais de 50 anos sobre o 25 de Abril de 1974. Haveria, hoje, espaço para o voltar a mostrar eventualmente numa versão mais completa?
R-Encontram-se sempre espaços de liberdade, mesmo quando as portas parecem fechar-se. E haverá sempre jornalistas e historiadores capazes de fazer melhor do que eu… Já não têm é a hipótese de falar com aqueles – muitos – que foram protagonistas da História mas já morreram, e com quem tive ainda oportunidade de falar. Espero que o meu trabalho possa ser útil nesse aspecto.
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Diana Andringa
Geração de 60
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